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Agricultura Regenerativa: Restaurar solos e ecossistemas como estratégia para o futuro do agro brasileiro

  • Foto do escritor: Milena Santos Silva
    Milena Santos Silva
  • 3 de set.
  • 4 min de leitura

A agricultura regenerativa vem ganhando destaque no Brasil e no mundo como uma abordagem inovadora para enfrentar os desafios ambientais, climáticos e produtivos do século XXI. Diferente dos modelos convencionais, que se baseiam fortemente no uso de insumos químicos, mecanização intensiva e monocultivos, a agricultura regenerativa propõe um reposicionamento radical: em vez de apenas mitigar impactos, busca-se restaurar ecossistemas agrícolas, ampliar a biodiversidade e revitalizar a saúde do solo, consolidando sistemas produtivos mais resilientes e eficientes.


Essa estratégia se distingue também da agricultura orgânica, que prioriza a eliminação de agrotóxicos e OGMs, mas não necessariamente avança para a recuperação ativa de processos ecológicos. A agricultura regenerativa vai além, fundamentando-se em práticas integradas como o plantio direto ou o mínimo revolvimento do solo, uso extensivo de cobertura vegetal, rotação de culturas, manejo integrado de pragas com bioinsumos e a integração de árvores e animais em sistemas agroflorestais e de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). Tais práticas formam um ciclo virtuoso que melhora a estrutura física e química dos solos, eleva o teor de matéria orgânica, aumenta a infiltração e retenção de água e cria condições favoráveis para uma microbiota diversa e ativa.


Um dos pontos mais relevantes da agricultura regenerativa reside no seu potencial de sequestro de carbono. Ao estimular o acúmulo de matéria orgânica no solo, essas práticas contribuem diretamente para retirar CO₂ da atmosfera, o que é crucial no combate às mudanças climáticas. Estudos indicam que agroflorestas podem sequestrar em média 1,2 t C/ha/ano, enquanto pastoreios rotacionados podem ultrapassar 2 t C/ha/ano em determinados sistemas, transformando solos agrícolas em sumidouros de carbono. Esse fenômeno cria um “duplo dividendo”, pois além de ajudar a mitigar o aquecimento global, melhora a fertilidade e a capacidade de retenção hídrica do solo, elevando a produtividade no longo prazo.


Os benefícios não se limitam ao ambiente. Agricultores que adotam práticas regenerativas relatam a redução de custos operacionais pela menor necessidade de fertilizantes sintéticos, defensivos químicos e irrigação. Paralelamente, a valorização de produtos certificados ou reconhecidos por práticas regenerativas abre mercados premium e novas oportunidades, já que consumidores e empresas globais buscam cadeias de fornecimento cada vez mais alinhadas a critérios ambientais rigorosos. Há ainda o potencial emergente do mercado de créditos de carbono, onde propriedades que comprovam o aumento do estoque de carbono em seus solos podem monetizar esse serviço ecossistêmico.


Além dos ganhos econômicos e ambientais, a agricultura regenerativa fortalece a resiliência dos sistemas produtivos frente a eventos climáticos extremos. Solos mais ricos em matéria orgânica suportam secas prolongadas e chuvas intensas com menos perda de produtividade, enquanto sistemas com maior biodiversidade oferecem controle biológico natural de pragas, reduzindo a dependência de químicos.


Por outro lado, a transição para esse modelo enfrenta desafios. Há barreiras culturais, pois produtores muitas vezes relutam em abandonar práticas consolidadas que oferecem respostas imediatas. Também existem obstáculos técnicos e financeiros, já que a adoção de práticas regenerativas pode demandar investimento inicial em máquinas adaptadas, sementes de cobertura e capacitação técnica. Soma-se a isso a ausência de um marco regulatório específico para o “regenerativo” no Brasil, diferentemente do orgânico, o que dificulta certificações formais, acesso a linhas de crédito direcionadas e maior reconhecimento de mercado.


Apesar desses entraves, exemplos no Brasil demonstram a viabilidade e o potencial da agricultura regenerativa em diferentes contextos. Projetos agroflorestais para cacau na Bahia recuperam áreas degradadas e aumentam a renda local, sistemas ILPF no Cerrado mostram ganhos de produtividade e acúmulo de carbono, e a cafeicultura em Minas Gerais avança para consórcios com árvores e práticas que protegem o solo e valorizam o produto no mercado externo.


A agricultura regenerativa, portanto, não se coloca apenas como uma alternativa pontual, mas como uma estratégia fundamental para reposicionar o agro brasileiro diante das exigências globais por rastreabilidade, baixo carbono e sustentabilidade. Restaurar solos, proteger recursos hídricos e ampliar a biodiversidade não é apenas uma questão ambiental, mas também de competitividade e segurança alimentar no longo prazo. Ao investir nesse paradigma, o Brasil consolida seu papel como fornecedor

estratégico de alimentos e serviços ecossistêmicos em um mundo cada vez mais atento à saúde do planeta.


Referencias


DANONE. Regenerative Agriculture: a resilient approach to build future food systems.

Paris: Danone, 2022. Disponível em: https://www.danone.com.

EMBRAPA. Práticas conservacionistas do solo e da água. Brasília: Embrapa Solos,

2023. Disponível em: https://www.embrapa.br/solos.

FAO. Regenerative agriculture: harmonizing production with natural ecosystems.

Roma: Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2023. Disponível em:

MUCHNIK, J. Localized agrifood systems: concept development and diversity of

situations. International Journal of Sociology of Agriculture and Food, v. 16, n. 1, p.

25-40, 2009.

NICHOLS, K. A.; SCHMIDT, S. M. Soil carbon sequestration: an overview of research

and policy developments. Soil Science Society of America Journal, v. 84, n. 1, p. 1-13,

2020.

RODALE INSTITUTE. Regenerative organic agriculture and climate change: a down-

to-earth solution to global warming. Kutztown: Rodale Institute, 2014. Disponível em:

SOUZA, H. N. et al. Carbon sequestration and nutrient cycling under perennial

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